quinta-feira, agosto 21, 2008

O enigmático sob o olhar chasconado

O enigmático sob o olhar chasconado
Por Juliana Barreto
Enigmático, esconde por trás de uma barba hippie, um olhar triste, de homem vivido, misturado ao sorriso alegre, de menino levado. Poderia, facilmente, ser considerado parte integrante de um movimento, que se convencionou chamar de contracultura, mas apenas e, exclusivamente, se esta figura tivesse pertencido aos desinfreados anos 60 e 70, que não é o caso.
Entretanto, pode-se dizer que o mesmo, em plenos tempos atuais, todavia adota um estilo de vida “maldito”, tendendo a uma espécie de socialismo-anarquista ou, no mínimo, que entra em desacordo com valores tradicionais da classe dita burguesa e das economias capitalistas e totalitárias. Trata-se, portanto, de um ser dotado de patriarcalismo, em busca de produzir cultura da terra e autêntica, exclamando contra a massificação, o consumismo, o autoritarismo, e os valores tradicionais, que, para tal, não tem legitimidade.
Enigmático sim, pois apesar dessa apresentação inicial, o dito-cujo ainda se alimenta também de uma condição sócio-cultural pertencente ao capitalismo contemporâneo caracterizado pelo fim das metanarrativas – grandes esquemas explicativos que garantiam à ciência o poder de verdade absoluta, pasmem: o cidadão vive de ciência, pertence ao planeta, ainda quase inesplorado, da acadêmia.
Embora haja controvérsias quanto ao seu significado e pertinência, o bom uso ou o mau emprego do protagonista e do termo ‘enigmático’, respectivamente, se tornou evidente aos olhos de uma personagem completa e rudemente chasconada. Tais controvérsias possivelmente resultem da dificuldade de se examinar processos em curso com suficiente distanciamento e, principalmente, de se perceber com clareza os limites ou os sinais de ruptura no dado processo.
Segundo alguns desavisados e utilizadores do ‘termo’, esta ‘condição’ enigmática caracteriza-se, principalmente, como crítico cineficista latino transgressor, o que poderia justificar sua lógica cultural sócio-anarquista tardia, correspondendo a uma realidade ambígua, tal qual seu olhar sério e sorriso maroto, multiformemente mascarados pela barba hippie, de homem conhecedor das idéias que operam na superação de si mesmo, na tentativa de questionar o mundo que o cerca.
Humildemente, La Chascona prefere denominá-lo “hippier-enigmático”, por considerar não ter havido, de fato, uma croncretização de um ser maldito, mas apenas a busca, o tentar o ainda-não-ousado, o novo, que por sua vez incorre em transgressão, ruptura com os tempos modernos, não como subversão da ordem, mas como implementação, criação, e, quem sabe, complementação.
Já o objeto de estudo, aqui descrito, concebe o conceito ‘enigmático’ de forma mais simplista, relacionando-o à posturas politicamente polidas, determinadas a portar-se de modos sóbrios, silenciando e calando qualquer tentativa de exito ou de exposição.

Fui ao MADA 2008

Sábado, dia de sol, noite chuvosa... Chuvosa??? Um ‘arrastão’ de gente molhada e ‘de molho’ a esperar por Seu Jorge. Foi bom o lugar... E, se não me embaçassem os pingos que caiam sobre a minha massa encefálica, cognitivamente limitada pelas várias “sóis” que bebi, lembro-me, com certa dificuldade, da longa noite de sábado que passei ali, dos espaços repletos de pessoas de todos os cantos da cidade e de outras cidades que ali chegaram com as mais diversas intensões, misturando os mais variados rostos e estilos; das paqueras, das roupas, dos playboys e dos malandros, das louras e das morenas com seus saltos-altos já castigados pelo desnível entre calçamento e barro, onde pessoas e vendedores ambulantes competiam por espaço, barro, chão molhado. Era pra ser o reduto dos apreciadores da boa música.
O evento foi ali, na Via Costeira, não na via, mas em um espaço paralelo a via. Os mais observadores poderiam até ter contestado, alegando o formato poligonal concêntrico da área de convivência daquele espaço que, aliás, de via costeira só restou o nome, pois não se via nada, nem mesmo qualquer sombra de costa atlântica, ou mesmo de show.
Nada de mais, espaço, areia, pistas de “dancing”, ladeira, subida, bares e caixas de isopor no meio da chuva a vender ‘Sol’. E não é uma ironia? Num lugar onde só se deu chuva, havia muitas e muitas ou muito, mas apenas, ‘Sol’ a venda.
Mas tudo bem, em resumo, um clima aconchegante – meio Europa cinzenta, porém sem os cafés ou os casacos de couro, apenas mesas nas cabeças, queixos batendo e ‘sol’ nas mãos. Bem Europa mesmo, mas de bicicletas só se viam os vários carrinhos – ‘bares móveis’ e taxistas a enfileirar-se ao longo da via, onde não se via coisa alguma.
Enfim, era a Via Costeira sediando o MADA 2008. E a gente toda estava lá, molhada na imensidão que se tornou a arena a céu aberto, feito “pintos molhados” apinhados em multidões, resvalados a uma tenda de circo. Mas o circo mesmo estava montado sob o nome de “área Vip”, onde se pagava R$40,00 para manter mechas recém escovadas que invariavelmente desfilaram por lá. E isso bastou.
Não diria apropriado, o lugar, resultado de alquimia bifásica de “heave” com tri vela, teve a intenção de ser agradável. Lá dentro, na área vip, a meia-luz, camisas salientando grifes, marcas, modelos, estilos ou simples propagandas de Bandas recém constituídas tratavam de chamar a atenção de quem entrava.
Teve-se de tudo, música ao vivo, dentro e fora, para todos os gostos e tons. O lugar, aos poucos, tornou-se ponto de encontro das pessoas ditas ‘descoladas’ da cidade que pra lá se dirigiram, lotando o circo, a área vip, o barro desnivelado e as calçadas da Via Costeira, que por sua vez tomava conta da via com suas mesas improvisadas ao estilo bar aberto. Era balada. Casa cheia. Valia tudo. Carros trafegavam com dificuldade em meio ao enxame de homens e mulheres correndo na chuva e da chuva e outros carros e ambulantes e mais gente e mais chuva...
Apesar de não ser fã de baladas da sociedade, fui ao MADA, fã da boa música. Afinal o evento MADA já se tornou um hábito, um costume, uma necessidade na cidade; foi mais forte do que eu. Tinha amigos e música boa. Não precisei de mais nada após o trampo, quando meu corpo fatigado da labuta estampou a mensagem de ‘low-batt’ ante meus olhos já cansados. Nem liguei, fui ao MADA.
No entanto ao primeiro passo dado em direção ao evento, meta daquela semana, deparei-me com a saudação da chuva, mas não me dei por vencida, segui em frente, fui ver seu Jorge na Via Costeira. E eu até cantei Seu Jorge, mas só os refrões, e dublei o restante das músicas, pois sabia que meus amigos, se ainda sóbrios, ririam do meu pobre conhecimento resumido a rádio e internet.
Por fim, fui pra casa de alma lavada, não só lavada, mas literalmente encharcada pela chuva, mas sai dali também de humor renovado devido à situação trágica, porém cômica que todos ali se encontravam. Fui embora pronta para enfrentar o dia seguinte, domingo, dia de sol, mas que por sorte minha já não teria apenas a opção ‘Sol’ para me alimentar...